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Nesta obra, Maria Lucia Homem procura lançar luz sobre a construção e crise da subjetividade do início do século XXI ao mediar o encontro inusitado entre Clarice Lispector e Jacques Lacan. Como a psicanálise pode contribuir para a renovação da leitura crítica das obras de Clarice Lispector? Nas primeiras décadas do século XXI, o que ainda resta a escutar de Clarice? A autora responde à questão ao abordar o embate entre palavra, silêncio e autoria, verdadeiro tripé esfíngico na escrita clariceana. Além de ter como base a psicanálise, com clara inspiração em Jacques Lacan, que com Sigmund Freud compõe referência central do livro, a abordagem de Maria Lucia é construída no campo da teoria literária e da filosofia estética, atualizando os debates promovidos por Nietzsche, Benjamin, Adorno, Barthes, Foucault, Auerbach, Anatol Rosenfeld e Cortázar. Esse conjunto de referenciais teóricos desdobra-se em um estudo sobre a noção de sujeito na obra de Clarice. O livro é calcado na análise dos três últimos romances da autora - 'Água viva', 'A hora da estrela' e 'Um sopro de vida', todos escritos nos anos 1970 -, nos quais se revela de forma mais clara uma inquietação com os limites da escrita, a relação entre a língua e o mundo, a palavra e a impossibilidade de dizer. São obras em que o sujeito criador (o autor) se esconde na multiplicidade de vozes narrativas e na ausência de um fio condutor. A autora escolheu abordar o tema do silêncio e da autoria. Nos três romances, o impronunciável manifesta-se como peça fundamental na busca de 'algo além do texto' - o silêncio é a origem, causa da narrativa e, ao mesmo tempo, polo para o qual se dirige a palavra. É a falta impulsionando a escrita que procuraria, então, significar a inapreensível totalidade do vivido. Já a questão da autoria, como segundo eixo determinante para o trabalho, é retomada em sua vertente problemática, desde os primórdios do romance dito moderno. O romance estruturalmente clássico - que buscava representar o universo subjetivo do herói individualizado - fica estremecido em suas bases sólidas e já estabelecidas. Abre espaço para uma maneira de compor em que personagem, narrador e autor se interceptam continuamente e na qual o silêncio aparece como ponto de fuga da narração, arrastando o próprio movimento da escritura. O pacto ficcional se altera, e o jogo entre silêncio e palavra se revela.